O chairman e sênior partner do BTG Pactual, André Esteves, é conhecido por sua visão “copo cheio” em relação ao Brasil. Por diversas vezes, ele apontou que o País evoluiu economicamente nos últimos anos, graças a reformas estruturantes e privatizações.
E, no momento em que os investidores estrangeiros estão reduzindo a concentração de seus portfólios nos Estados Unidos – por conta da condução econômica do governo Trump e os riscos geopolíticos -, olhando o mundo em busca de oportunidades, ele avalia que o País pode ser um destino desses recursos.
Mas para consolidar essa situação, será preciso lidar com a situação fiscal, uma situação complexa, mas que Esteves entende que pode ser colocada na direção correta com alguns ajustes.
“Entramos no radar [dos investidores globais], os valuations estão baratos. E temos como consertar aquilo que precisa ser consertado”, disse Esteves, na quinta-feira, 26 de junho, na abertura do Global Managers Conference 2025, evento do time de asset management do BTG Pactual. “Não é difícil consertar as coisas e essa é a percepção dos investidores internacionais, especialmente os sofisticados, que estão olhando para cá.”
Segundo ele, os ativos brasileiros apresentam “prêmio para todo lado”, seja na renda fixa ou na Bolsa, onde os múltiplos estão mais baixos do que os vistos nos mercados americanos. Tudo isso numa economia que pode crescer entre 2% e 2,5% neste ano, apesar dos juros na casa dos 15% ao ano, e com o País fora do epicentro da guerra comercial e de disputas geopolíticas.
“Tudo isso está atraindo a atenção global e as coisas por aqui estão relativamente funcionais”, disse Esteves. “As nossas confusões estão em linha ou são melhores do que as que estão por aí.”
Mas o tema fiscal é a pedra no sapato brasileiro. Segundo Mansueto Almeida, economista- chefe do BTG Pactual, que participou da abertura do evento com Esteves, o Brasil corre o risco de fechar 2026, no fim do atual governo, com um déficit nominal perto de 8,5% do PIB, elevando a dívida do País de cerca de 70% para quase 85% do PIB.
Não controlar essa situação manterá os juros elevados e afetará as perspectivas de inflação, pesando sobre os investimentos. “Estamos em situação difícil porque a despesa cresce em ritmo muito forte. Qualquer governo, seja A ou B, precisa desacelerar o crescimento do gasto”, afirmou.
Assim como Esteves, Almeida avalia que a situação é possível de ser endereçada desacelerando o ritmo de expansão dos gastos públicos. Uma medida de efeito imediato seria a revisão da política de valorização do salário mínimo.
Ele disse que isso teria um impacto significativo nas contas públicas, considerando que metade das despesas primárias são determinadas pela Previdência e gastos sociais. “Ajuste fiscal não é cortar R$ 100 bilhões de um ano para o outro, porque 90% da despesa é obrigatória. Ajuste fiscal é desacelerar o crescimento dos gastos públicos”, afirmou.
Almeida também avaliou que existem ajustes que podem ser feitos pelo lado da arrecadação, como a extinção de regimes tributários especiais que não funcionam e colocar um teto para deduções de gastos com saúde, mas ressaltou que a União já tributa demais. “O problema fiscal não é de arrecadação, a gente gasta muito. Essa característica do Estado precisa mudar”, disse.
Estados Unidos, uma confusão
Por mais que o tema fiscal tenha sido colocado como uma questão para o Brasil, Esteves afirmou que o que está acontecendo no exterior, sobretudo nos Estados Unidos, está tendo muito mais impacto nos preços dos ativos brasileiros do que o debate fiscal ou outras questões internas.
Depois de anos sendo um “buraco negro” financeiro, atraindo capital de todas as partes do mundo, os Estados Unidos veem uma desaceleração da entrada de recursos, por conta das políticas econômicas do governo Trump.
Esteves disse que a equipe econômica americana apresenta uma concepção equivocada. E a forma com que coloca essas convicções em práticas, sobretudo na questão de comércio exterior, resultou em volatilidade e insegurança.
“Virou confusão, não tem respaldo na realidade”, afirmou. “Eles têm déficit comercial estrutural desde a década de 1970 e nenhum país ficou tão rico como os Estados Unidos.”
Essas políticas, combinadas com algumas restrições à imigração, declarações fustigando aliados históricos, como o Canadá, e também as autoridades internas, sobretudo ao presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Jerome Powell, estão enfraquecendo o dólar.
“Não tem nada de errado na economia americana, está tudo certo. O Fed [banco central dos Estados Unidos] está certo em ficar on hold, a economia está forte, sentindo um pouco de desaquecimento na margem por juro alto, mas tudo dentro do padrão”, afirmou Esteves. “Mas moeda não é só economia. A força de uma moeda tem a ver também com previsibilidade, transparência, rule of law.”
A situação faz com que os investidores internacionais revejam posições em ativos americanos. Mas isso nem tem ocorrido de forma homogênea, com Esteves destacando que esse movimento afeta mais as Treasuries e o dólar.
“Os portfólios globais não venderam de forma relevante ações americanas, mas provavelmente não compraram”, afirmou. “As companhias continuam espetaculares, a inovação está lá. Os valuations estão ricos, não vivemos uma bolha, mas as empresas não estão baratas, porque são espetaculares.”