O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, afirmou, neste domingo (14), estar disposto a abandonar a candidatura de seu país para ingressar na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em troca de garantias de segurança do Ocidente, mas rejeitou a pressão dos Estados Unidos para ceder território à Rússia enquanto mantinha conversas com enviados americanos sobre o fim da guerra.
Zelensky se reuniu com o enviado especial do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Steve Witkoff, e com o genro de Trump, Jared Kushner. O líder ucraniano publicou fotos da mesa de negociações, com o chanceler alemão Friedrich Merz sentado ao seu lado, em frente à delegação americana.
Ao responder a perguntas de jornalistas em áudios enviados a um grupo de WhatsApp antes das conversas, Zelensky declarou que, como os Estados Unidos e algumas nações europeias rejeitaram a tentativa da Ucrânia de entrar na Otan, Kiev espera que o Ocidente ofereça um conjunto de garantias semelhantes às concedidas aos membros da aliança. “Essas garantias de segurança são uma oportunidade de evitar outra onda de agressão russa”, afirmou. “E isso já é uma concessão da nossa parte.”
O presidente russo, Vladimir Putin, tem apresentado a candidatura da Ucrânia à Otan como uma grande ameaça à segurança de Moscou e como uma das razões para lançar a invasão em larga escala em fevereiro de 2022. O Kremlin exigiu que a Ucrânia renuncie à candidatura à aliança como parte de qualquer possível acordo de paz.
Zelensky enfatizou que quaisquer garantias de segurança precisariam ser juridicamente vinculantes e respaldadas pelo Congresso dos Estados Unidos, acrescentando que esperava uma atualização de sua equipe após uma reunião entre autoridades militares ucranianas e americanas em Stuttgart, na Alemanha.
Washington tenta há meses equilibrar as exigências de cada lado, enquanto Trump pressiona por um fim rápido da guerra da Rússia e demonstra crescente frustração com os atrasos. A busca por possíveis compromissos enfrenta grandes obstáculos, incluindo o controle da região oriental de Donetsk, na Ucrânia, que está em grande parte ocupada por forças russas.
Obstáculos duros pela frente
Putin exigiu que a Ucrânia retire suas forças da parte da região de Donetsk que ainda está sob seu controle como uma das condições-chave para a paz — exigências que Kiev rejeitou. Zelensky afirmou que os Estados Unidos haviam proposto uma ideia para que a Ucrânia se retirasse de Donetsk e criasse ali uma zona econômica livre desmilitarizada, proposta que ele rejeitou por considerá-la impraticável.
“Não considero isso justo, porque quem vai administrar essa zona econômica?”, questionou. “Se estamos falando de alguma zona de amortecimento ao longo da linha de contato, se estamos falando de alguma zona econômica e achamos que deveria haver apenas uma missão policial ali e que as tropas deveriam se retirar, então a pergunta é muito simples. Se as tropas ucranianas se retirarem 5 a 10 quilômetros, por exemplo, por que as tropas russas não se retirariam mais profundamente dos territórios ocupados à mesma distância?”
Zelensky descreveu o tema como “muito sensível” e insistiu em um congelamento ao longo da linha de contato, dizendo que “hoje uma opção possível e justa é permanecermos onde estamos”.
O assessor de política externa de Putin, Yuri Ushakov, disse ao jornal de negócios Kommersant que a polícia russa e as tropas da Guarda Nacional permaneceriam em partes da região de Donetsk, mesmo que ela se torne uma zona desmilitarizada sob um eventual plano de paz. Ushakov advertiu que a busca por um acordo pode levar muito tempo, observando que propostas dos Estados Unidos que levavam em conta as exigências russas foram “pioradas” pelas modificações sugeridas pela Ucrânia e por seus aliados europeus.
Em declarações à televisão estatal russa transmitidas no domingo, Ushakov afirmou que “é pouco provável que a contribuição dos ucranianos e europeus para esses documentos seja construtiva”, alertando que Moscou terá “objeções muito fortes”. Ele acrescentou que a questão territorial foi discutida ativamente em Moscou quando Witkoff e Kushner se reuniram com Putin no início deste mês. “Os americanos conhecem e entendem nossa posição”, disse.
Zelensky informou que conversou com o presidente francês Emmanuel Macron no domingo, pouco antes das conversas com os enviados de Trump, agradecendo-lhe no X pelo apoio e acrescentando que “estamos coordenando de perto e trabalhando juntos em prol de nossa segurança compartilhada”. Macron prometeu no X que “a França está, e continuará estando, ao lado da Ucrânia para construir uma paz sólida e duradoura, capaz de garantir a segurança e a soberania da Ucrânia — e da Europa — no longo prazo”.
Merz, que tem liderado os esforços europeus de apoio à Ucrânia ao lado de Macron e do primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, afirmou no sábado que “as décadas da ‘Pax Americana’ praticamente chegaram ao fim para nós na Europa, e também para nós na Alemanha”. Ele advertiu que o objetivo de Putin é “uma mudança fundamental das fronteiras da Europa, a restauração da antiga União Soviética dentro de suas fronteiras”. “Se a Ucrânia cair, ele não vai parar”, alertou Merz no sábado, durante uma conferência partidária em Munique.
Putin nega ter planos de restaurar a União Soviética ou de atacar qualquer aliado europeu.
Rússia e Ucrânia trocam ataques aéreos
A Força Aérea da Ucrânia informou que, durante a noite, a Rússia lançou mísseis balísticos e 138 drones de ataque contra o país. Em seu relatório diário, a Força Aérea afirmou que 110 foram interceptados ou abatidos, mas houve impactos de mísseis e drones em seis localidades.
Zelensky afirmou no domingo que centenas de milhares de famílias continuavam sem eletricidade nas regiões sul, leste e nordeste e que os trabalhos para restaurar o fornecimento de energia, aquecimento e água corrente seguiam em andamento em várias regiões após um ataque em larga escala na noite anterior. O presidente ucraniano destacou que, na última semana, a Rússia lançou mais de 1.500 drones de ataque, quase 900 bombas aéreas guiadas e 46 mísseis de vários tipos contra a Ucrânia.
O Ministério da Defesa da Rússia disse que suas defesas aéreas derrubaram 235 drones ucranianos na noite de sábado e na madrugada de domingo. Na região de Belgorod, um drone feriu um homem e incendiou sua casa no vilarejo de Yasnye Zori, segundo o governador regional, Vyacheslav Gladkov. Drones ucranianos atacaram um depósito de petróleo em Uryupinsk, na região de Volgogrado, provocando um incêndio, de acordo com o governador regional, Andrei Bocharov. Na região de Krasnodar, drones ucranianos atacaram a cidade de Afipsky, onde há uma refinaria de petróleo. As autoridades disseram que as explosões quebraram janelas de prédios residenciais, mas não relataram danos à refinaria.