O colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) suspendeu, após pedido de vista, o julgamento de Fernando Passos, ex-vice-presidente executivo financeiro e de relações com investidores do IRB Brasil Re, e de José Carlos Cardoso, ex-diretor presidente da resseguradora. A análise do caso teve início nesta segunda-feira (29), na última sessão de julgamentos do ano.
Passos foi acusado de irregularidades que teriam ocorrido entre 2019 e 2020: divulgação seletiva de informações sigilosas e relevantes, divulgação de informação falsa ao mercado negando a renúncia do presidente do conselho de administração do IRB, recompra irregular de ações e liberalidade na aprovação de pagamentos indevidos de bônus milionários. Cardoso também foi enquadrado na acusação relacionada à aprovação dos bônus.
O caso, aberto em 2020, estava sob relatoria do diretor e presidente interino, Otto Lobo. O mandato de Lobo como diretor termina em 31 de dezembro, e esta semana seria a última oportunidade para colocar o caso em pauta como relator.
Lobo votou pela absolvição dos dois acusados em todas as acusações. Em relação a Passos, afirmou que não houve provas suficientes que permitissem comprovar responsabilidade. Quanto a Cardoso, disse que não há evidências de que tenha atuado de forma irregular, acolhendo a sustentação da defesa.
Autodeclarada impedida, a diretora Marina Copola foi substituída pelo superintendente Luis Felipe Lobianco, que pediu vista do caso. Na sequência, o diretor João Accioly informou que vai esperar a retomada do caso para manifestar o voto.
De acordo com a Superintendência de Processos Sancionadores (SPS), que formulou a acusação, Passos teria vazado informações sigilosas à imprensa e divulgado ao mercado comunicado considerado falso, ao negar a renúncia do então presidente do conselho de administração do IRB, Ivan Monteiro, mesmo após o protocolo formal do pedido. A acusação sustentou ainda que Passos executou um programa de recompra de ações acima do limite autorizado pelo conselho, adquirindo 7,85 milhões de papéis quando o teto seria de 5 milhões.
Outro ponto central do processo envolve a autorização de pagamentos de bônus considerados irregulares. A SPS apontou que Passos e Cardoso teriam praticado atos de liberalidade ao autorizar a distribuição de cerca de R$ 46,6 milhões em prêmios a executivos, incluindo eles próprios, relacionados à venda de ativos como shopping centers e a subsidiária United Americas Insurance Company (UAIC). Para a área técnica, os pagamentos teriam desrespeitado o limite global de remuneração aprovado em assembleia e não passaram pelos comitês internos competentes.
Em 19 dezembro do ano passado, o colegiado da CVM também julgou outro processo contra Passos e Cardoso, que resultou na condenação unânime do primeiro acusado à multa de R$ 20 milhões (o valor máximo permitido). Ele era réu por possível manipulação de preços de ações em 2020. No mesmo caso, Cardoso teve absolvição total da acusação de falha no dever de diligência.
Em sustentação oral nesta segunda-feira, a defesa de Passos afirmou que as acusações de recompra irregular de ações e de pagamento indevido de bônus não se sustentam. Segundo a advogada Leticia Braz Mendonça, a ata do conselho divulgada ao mercado e enviada à CVM previa apenas um limite global de até 40 milhões de ações, sem menção a teto de 5 milhões. Ela criticou a acusação por se apoiar em nota técnica “meramente consultiva” e em uma “suposta ata” registrada mais de um ano depois dos fatos.
Nos autos, a defesa de Passos também pediu a nulidade absoluta do processo, afirmando que a acusação se baseou em provas oriundas de um inquérito policial posteriormente anulado pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) e pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em razão da suspeição do juiz responsável.
No mérito, sustentou que a renúncia de Monteiro só teria produzido efeitos após comunicação formal da União – que tinha influência sobre a resseguradora por meio de empresas e instituições que tinham participação relevante – ao IRB e que o limite de recompra de ações não constava na ata que recebeu.
Quanto aos bônus, afirmou que os pagamentos eram regulares e devidamente contabilizados, ressaltando que foram feitos pela subsidiária IRB PAR a um prestador de serviços, e não integram a remuneração de administradores.
Também nos autos, a defesa de Cardoso declarou que o cliente foi vítima de uma “grande fraude” supostamente arquitetada por Passos, que exerceria controle de fato sobre subsidiárias do grupo. Também questionou a validade de assinaturas em documentos que previam o pagamento dos bônus, sugerindo que poderiam ter sido obtidas de forma inconsciente ou em papéis adulterados, e reiterou não ter recebido qualquer valor a título desses prêmios.
“Estamos falando de uma suposta fraude, de documentos que foram adulterados. E com certeza absoluta Cardoso não teve nenhuma participação, não recebeu pagamento indevido”, afirmou o advogado Denis Morelli no julgamento.
Procurados, o IRB e os advogados de defesa não se manifestaram até esta publicação. O espaço segue aberto.