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Enfermagem produz receitas, riquezas e valores essenciais à economia do Brasil

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Mateus Gonçalves

Mateus é advogado, especialista em Direito Previdenciário. Atuante em direito trabalhista e previdenciário para profissionais de enfermagem.
23 de dezembro de 2024

Valores investidos na maior força de trabalho da saúde se convertem em vetor de desenvolvimento econômico e previdenciário importante para o futuro do país

O piso nacional da enfermagem veio trazer dignidade para a maior força de trabalho do sistema de saúde brasileiro. Inobstante o importante papel que desempenham no momento da vida em que as pessoas mais precisam de ajuda e cuidado, essas trabalhadoras e trabalhadores ainda convivem com a desvalorização explícita, exposta a baixos salários incompatíveis com a complexidade técnica do serviço que desenvolvem em benefício direto da humanidade.

Entre outros aspectos, discute-se o impacto financeiro do piso da enfermagem sobre a economia e, mais especificamente, sobre o sistema previdenciário brasileiro, em seus múltiplos regimes. Assim, é necessário percorrer os itinerários dessa política pública para estimar as implicações orçamentárias, sociais e políticas em um futuro próximo, sobretudo nos próximos 50 anos.

Se esse é um problema sensível para a classe trabalhadora, é ainda mais grave para os aposentados. Profissionais que são desvalorizados a vida inteira encontram na velhice as dificuldades de viver com aposentadorias que nem de longe atendem as necessidades mais básicas. Assim, famílias pressionadas por orçamentos limitadíssimos podem ser empurradas para a miséria, mesmo tendo contribuído diretamente para a saúde da população e para a economia do país.

É uma injustiça social e econômica escancarada, que precisa ser enfrentada e resolvida. Contudo, diante de políticas públicas redistributivas, como é o piso nacional da enfermagem, forças obscuras do chamado mercado e de correntes políticas anacrônicas insurgem com ameaças de que a valorização da categoria pode quebrar o setor, causar demissões, levar os hospitais ao colapso e gerar impacto econômico e previdenciário negativo para a sociedade.

Evidentemente, não é lógico esse tipo de raciocínio. Segundo estimativas do Ministério da Saúde, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em 2023, o orçamento da saúde pública chegou a R$ 463 bilhões e do setor privado, R$ 542 bi. O gasto total com saúde no Brasil alcança 9,5% do Produto Interno Bruno (PIB). É menor do que a média de 11,5% registrada nos países que fazem parte da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Por outro lado, com investimento de apenas R$ 7 bilhões em 2023 e R$ 10 bi, em 2024, a União está conseguindo colocar o piso em prática nos estados, municípios e entidades suplementares que atendem pelo menos 60% dos pacientes provenientes do Sistema Único de Saúde (SUS), conforme manda a Lei 14.434/2022. Da mesma forma, a grandeza dos números mostra que o setor privado também é capaz de colocar em curso a maior revolução social e econômica da enfermagem no Brasil.

Assim, esse raciocínio leva a crer que, se quisermos ser um país desenvolvido de verdade, precisamos investir pelo menos mais 2% do PIB em saúde. Sobretudo, esse investimento deve ser feito nas pessoas que fazem a saúde funcionar, com a entrega de salários mais justos aos profissionais de enfermagem. Ato contínuo, será possível garantir aposentadorias menos constrangedoras aos profissionais de saúde em um futuro próximo.

Importante destacar que os recursos que são investidos na enfermagem voltam para a economia do país. Trata-se de trabalhadores que são consumidores de serviços, produtos e gêneros que movimentam o comércio e a indústria de maneira perene. Além disso, como se trata de uma maioria absoluta de empregados formais, são trabalhadores capazes de incrementar as receitas previdenciárias e ajudar a manter o equilíbrio do sistema.

O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) estima que a implantação plena do piso da enfermagem assegura o incremento de pelo menos R$ 7,8 bilhões por ano na arrecadação previdenciária, ao passo que garante o pagamento de aposentadorias mais justas para quem realmente merece, proporcionando maior dignidade e qualidade de vida aos profissionais de enfermagem futuramente inativos.

Piso da Enfermagem: Impactos da Aposentadoria – Um dos 17 Objetivos da Agenda 2030, documento construído em 2015, pelos 193 países-membros da ONU, para promover o desenvolvimento sustentável e assim transformar o Mundo, trata da saúde e do bem-estar de todas as pessoas do planeta. As metas incluem desde a redução da mortalidade infantil até o combate de enfermidades como o HIV e outras doenças transmissíveis. Ao adotarem o documento, os países comprometeram-se a tomar medidas ousadas e transformadoras para promover o desenvolvimento sustentável nos próximos 15 anos, sem deixar ninguém para trás. O Brasil é país membro da ONU e alcançar esses objetivos só será possível com o trabalho da Enfermagem. Afinal, como alcançar esta meta sem cuidar de quem cuida da saúde de todo o país?

Fazendo uma análise à luz da legislação, o cálculo da aposentadoria de um enfermeiro que, em vários municípios brasileiros, recebiam apenas valores que orbitam um salário mínimo, com a implementação do piso salarial para os profissionais de enfermagem concursados, ou seja, servidores públicos que tomaram posse até 31 de dezembro de 2003 e preenchem os requisitos de aposentadoria com integralidade e paridade, esses terão direito de se aposentar com o valor que o servidor da ativa recebe, ou seja, o valor do piso salarial da enfermagem.

Para quem ingressou no serviço público a partir de 1º de janeiro de 2004 ou trabalha na iniciativa privada e/ou em entidades filantrópicas, a aposentadoria será por média aritmética de 100% de todas suas contribuições. No entanto, até esses profissionais de enfermagem serão beneficiados.

Analisando outro cenário, supõe-se: uma enfermeira com 40 anos de idade hoje e 20 anos de contribuição iria se aposentar em 15 de maio de 2037, data em que a profissional de enfermagem completaria os requisitos para aposentadoria especial, ou seja, 86 pontos (que é a soma de idade mais tempo de contribuição). Caso mantivesse uma contribuição média de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por mês, com um reajuste anual de mais ou menos 5%, a aposentadoria da profissional ficaria em média de R$ 3.471,77. Já com a contribuição a partir de junho de 2023, com o valor do piso salarial de R$ 4.750,00 (quatro mil setecentos e cinquenta reais) e também com uma correção anual de 5%, o valor da sua aposentadoria na mesma data seria em torno de R$ 5.592,26, ou seja, mais de R$ 2.000,00 (dois mil reais) de diferença. Sendo assim, o valor da aposentadoria restaria impactado de forma benéfica.

Infelizmente, para quem está próximo de se aposentar, esse impacto não será tão relevante, visto que não terá um aumento muito grande em sua média. Mas para quem faltam alguns anos, como a simulação acima, essa sim será beneficiada com o pagamento do piso para fins de sua aposentadoria.

Trabalho Digno e Decente – Outro objetivo proposto pela Agenda 2030 da ONU trata da promoção do crescimento econômico sustentado, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos. Formalizado pela Organização Internacional de Trabalho (OIT), o conceito de trabalho decente sintetiza a sua missão histórica de promover oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade, sendo considerada condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável. Como o Brasil pretende cumprir a meta da Agenda 2030, que trata da dignidade e do trabalho decente, se a Enfermagem, maior categoria de trabalho da Saúde do país, não tem suporte, nem acolhimento digno?

O país não pode pagar com ingratidão a quem lhe socorre nos momentos mais difíceis, como foi a pandemia da covid-19. Estamos diante de uma epidemia de dengue e, mais uma vez, são os profissionais de enfermagem que estão nas unidades de saúde dando a vida para salvar pacientes da morte. Da mesma sorte, no cotidiano são esses mesmos profissionais que estão disponíveis para a população que mais precisa. É necessário valorizar.

O piso da enfermagem é uma importante política de combate à desigualdade social e econômica que ainda impera na sociedade. Não é mais possível conviver com meia dúzia de empresários da saúde bilionários e milhões de profissionais que recebem salário mínimo. É hora de mudar, o presente e o futuro.


Mateus é advogado, especialista em Direito Previdenciário. Atuante em direito trabalhista e previdenciário para profissionais de enfermagem.

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