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“Engenharia do cardápio”: quando o clima decide o que vai no prato

"Engenharia do cardápio": quando o clima decide o que vai no prato


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A Nutrisaude utiliza uma “engenharia do cardápio” que combina custos, sabor, qualidade nutricional e dados meteorológicos para planejar, com dois meses de antecedência, as refeições servidas diariamente a 35 mil pessoas. O monitoramento climático e a sazonalidade dos alimentos permitem ajustes no cardápio para mitigar impactos de eventos como a La Niña, evitando aumentos de até 20% nos custos e reduzindo desperdícios.

A empresa substitui ingredientes conforme variações de preço e oferta, mantendo valor nutricional e apelo visual. Cerca de 60% dos produtos hortifrutigranjeiros vêm da agricultura familiar, o que agiliza adaptações e reduz perdas logísticas. A previsibilidade é essencial para manter a inflação interna abaixo dos índices oficiais e garantir equilíbrio contratual.

* Resumo gerado por inteligência artificial e revisado pelos jornalistas do NeoFeed

Nas cem cozinhas industriais da Nutrisaude, espalhadas por 14 estados brasileiros, o menu de amanhã não depende apenas dos cozinheiros e nutricionistas, mas do clima. Entre panelas fumegantes, travessas de salada e potes de sobremesa, corre o cálculo de quanto vale antecipar o futuro.

Uma equação complexa, na qual se combinam custos, sabor, qualidade nutricional e até as cores dos alimentos com dados meteorológicos. É o que o cofundador e CEO Victor Franco chama de “engenharia do cardápio”.

Graças a essa matemática, a Nutrisaude consegue definir, com dois meses de antecedência, o prato a ser servido todos os dias a cerca de 35 mil pessoas — funcionários dos cem clientes da companhia. Entre eles, Unilever, Shopee, Haribo, Tudor Baterias e alguns hospitais da rede Unimed.

Em tempos tão incertos quanto os atuais, de aquecimento global, o respeito à sazonalidade e o monitoramento climático são ingredientes básicos das 3 mil receitas cadastradas no sistema da empresa, fundada em 2017, em Bauru, no interior paulista. Com o planejamento, é possível reduzir gastos e evitar o desperdício de alimentos.

Antes da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), em 10 de outubro, confirmar a ocorrência (“fraca, mas persistente”) do fenômeno La Niña para a primavera/verão de 2025/2026, a Nutrisaude já trabalhava com essa hipótese.

“Se cruzássemos os braços e seguíssemos sem considerar a La Niña, nossos custos poderiam aumentar 20%”, calcula Victor, em conversa com o NeoFeed.

Caracterizado pelo resfriamento das águas do Pacífico Equatorial, o evento influencia o equilíbrio climático do planeta, alterando temperaturas, chuvas e ventos, entre outros fatores — com impacto, claro, na produtividade agropecuária.

Vale lembrar o que aconteceu no Rio Grande do Sul entre 2021 e 2023. Com três estiagens seguidas durante as safras, por causa do La Niña, as perdas nas lavouras de soja, em algumas regiões, chegaram a 60%. No mesmo período, a produção de milho e leite também caiu por falta de água e pastagem.

A gestão orientada pela previsibilidade, a partir de dados do clima e da sazonalidade dos alimentos, permite ajustes no cardápio, explica Victor. Se a alface corre o risco de encarecer, dá para trocá-la por acelga. Ou a beterraba por cenoura… e, se o preço do frango sobe, em vez de tirá-lo do menu, o empresário diminui a porção da proteína e passa a oferecê-la de outro modo —  em panquecas, por exemplo.

Pequenos produtores

Alguns itens, no entanto, têm pouca margem de manobra, conta o executivo. Um deles é o feijão. “Nós alternamos entre o carioca e o preto, mas não há substitutos”, afirma. “O feijão é uma das culturas mais sensíveis às mudanças climáticas.” Com o café, a situação é semelhante. Nessas situações, o custo é compensado em outras categorias de alimentos, como nas guarnições.

E tudo isso é feito sem comprometer nem o valor nutricional dos preparos, tampouco seu visual. Pode parecer bobagem, mas pratos coloridos, bem arranjados, são mais atrativos. Parecem mais saborosos, nutritivos e frescos — e, em geral, o são mesmo.

“Planejar a alimentação com base no clima e na sazonalidade não é mais apenas uma estratégia — é questão de sobrevivência”, diz o CEO Victor Franco (Foto: Divulgação/Nutrisaude)

Cerca de 60% das frutas, legumes e verduras usados pela Nutrisaude vêm de pequenos agricultores (Foto: Divulgação/Nutrisaude)

A parceria com os agricultores familiares é também crucial para Victor manter as operações dentro do previsto. Cerca de 60% das frutas, legumes e verduras utilizados pela Nutrisaude vêm das pequenas propriedades.

O contato direto com esses produtores agiliza as adequações de cardápio. E, eles conseguem escoar a produção, evitando a perda de alimentos por falta de mercado — o que garante renda para um grupo historicamente vulnerável.

Tem mais. A logística entre os agricultores e as cozinhas da Nutrisaude tende a ser menor, o que reduz o risco de desperdício durante o transporte e o armazenamento. Cai também a pegada de carbono da transação.

“Como o alimento representa 50% do meu custo, se eu não tiver previsibilidade, quebro o equilíbrio contratual”, diz Victor.

A Nutrisaude reajusta seus preços uma vez ao ano, com base em índices como o IPCA. Isso obriga a companhia a manter a “inflação interna” sempre mais baixa do que os indicadores oficiais. O custo da alimentação no Brasil acumula alta de 7,4% nos últimos 12 meses, segundo o IBGE.

Para uma empresa que serve 18 milhões de refeições por ano, produzidas a partir de 10 mil toneladas de alimentos, trocas no menu em cima da hora podem custar muito caro.

“Planejar a alimentação com base no clima e na sazonalidade”, diz Victor, “não é mais apenas uma estratégia — é questão de sobrevivência”.

Ao que tudo indica, a tal “engenharia do cardápio” está funcionando. Com 1,5 mil funcionários, a Nutrisaude deve fechar 2025 com um faturamento de R$ 200 milhões. E, até 2030, movimentar meio bilhão de reais.

Formado em engenharia de produção, o empresário, hoje com 34 anos, fundou a Nutrisaude com o primo Thiago Franco. Ambos cresceram em meio às cozinhas industriais.

Seus pais são os donos da NS Group, de fornecimento de alimentação para o setor público. Depois de terminar a faculdade, Victor chegou a trabalhar na empresa da família. Logo, no entanto, percebeu: as instituições governamentais não eram o seu negócio. Entre os principais motivos, a imprevisibilidade.



Ceará Agora e Diário do Nordeste

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